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100Destino

Onde um destino sem destino procura um destino entre cem.

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Onde um destino sem destino procura um destino entre cem.

O Mais Importante Feito da Criação 2/10

Maio 30, 2010

 

E agora frente a frente com a epítome da beleza, uma imagem tantas vezes vista e nunca antes observada, hoje transformou-se na obliqua luz da manhã e encontrou o seu destino como origem da arte.

Vinha buscar o que me pediste.”

Nada, vazio. Todos os processos da alma desistiram de mim. Vivo para um só propósito: capturar a essência da Beleza e fixá-la para todo o sempre.

Não consegui acabar.”

Flora entrou sem pedir. Passou por mim sem uma palavra e percorreu a sala mutilada pela violência da noite. Parou.

Gostei deste.”

Eu não gostei desse. Não gostei daquele. Não gostei de nenhum destes que espelham o meu desespero e insistem em me assombrar as noites. Fantasmas, sintomas do vício, reflexos de um eu que não quero que exista mas que ressurge quando menos se espera.

Está inacabado.”

Os seus olhos comprimem-se na impaciência e os seus gestos suaves aumentam de ritmo. Observo a angústia enquanto escorre uma linha de tinta levantando a ponta de um pincel.

Acabaste algum?”

Flora continua a passear-se pelos quadros como folheando um livro. A sua silhueta translúcida muda na claridade da manhã, transforma-se através do espaço.

Trabalhei toda a noite e até agora a inspiração não tinha chegado.”

Flora roda ligeiramente nos calcanhares. Sorriu com os olhos. As palavras tinham-me saído sem propósito mas com uma finalidade da qual eu não era dono. Agora era como se o destino tive-se tomado conta de todas as nossas acções num sistema indefinível com o propósito de se auto-cumprir.

O que mudou entretanto?”

Ao abrir da porta a inspiração chegou.”

O Mais Importante Feito da Criação 1/10

Maio 23, 2010

 

Passo a noite preso nos fétidos subúrbios da criação. Infeliz castigo que o destino me reservou. A Ideia foge-me gota a gota por entre os dedos semicerrados.

Sozinho procuro a origem da forma. O ténue sentido da claridade que me iluminará o caminho.

Será a realidade apenas um corte transversal através de múltiplas superfícies de contraste?

Solto selvagens gritos de tinta. Atinjo o branco da tela com o metálico chicote da cor e inconsequente apenas produzo perspectivas inúteis.

Passam minutos sobre minutos onde vivo várias mortes à procura do rasto indelével da Beleza. O seu peso afunda-me na ingratidão da Obra.

Esbracejo pincéis, voam espátulas vingativas no pico agreste da incompetência. Nasço e renasço nesta vil tortura e morro estéril na insensata busca pela Perfeição.

Mergulho no escuro liquido do Processo e navego em apneia na vã esperança de um dia conseguir ver a luz.

Órfão de sensações, a cor já não existe e o cheiro à muito que se tornou uma memória perdida num marasmo de incertezas, uma aflição sob a pele que não consigo expurgar de mim.

Preciso da milagrosa panaceia da epifania. Embriagar-me nos seus espectros, cambiantes, sombras reveladoras, profundidades; como gota sapiente que pudesse dar sentido a esta busca.

É um pesadelo insone este que me persegue mas dormirei apenas na solene madrugada da vitória, no derradeiro momento da feliz concretização que até agora me tem escapado.

Entretanto aqui fico. Submerso no diabólico percurso pelos múltiplos fios do nó górdio à procura da escondida face da beleza, do rosto supremo da plenitude, da razão de ser da arte que apesar de escondida me domina.

E no súbito toque da campainha surge o inesperado esplendor do outro lado da porta agora aberta.

Flora sem o saber chegou.

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