ne varietur
Abril 14, 2009
sentava-me aqui sempre à espera do teu olhar obliquo, da tua graça africana, do doce do teu olhar, o fascínio do teu andar descalço, o teu jeito de levitar o passo pé ante pé sem tocar no chão, sentia-te minha sem saber o teu nome, o facto de o não saber levava-me para longe, para terras distantes perfumadas de almíscar e terra molhada, via-te rainha e princesa de uma terra desconhecida largada de ouro e marfim esculpido a lágrimas, não espero nada de ti a não ser a esperança de um um olhar esguio deixado cair subtilmente da tua altivez nobre, uma pétala de rosa que flutuasse no próprio perfume na direcção da palma da minha mão, para que eu a possa cultivar e nutrir como a um pé de feijão mágico que poderia-me levar como a uma criança a um mundo mágico e fantástico cheio de odores e sabores perdido no meio de um imaginário que seria só nosso, insubstituível e inacessível poderíamos viver ao nosso gosto, navegando as ondas tépidas da paixão sem pensar em porto ou destino, perdidos no tempo e achados no abraço fraterno e suave um do outro como em paralelo com este mundo que não nos deixa trocar olhares onde as palavras são censuradas e nunca as verdadeiras, toca-me a tua fragilidade escondida por trás dessa imagem de fêmea feroz, sinto-te as garras recolhidas por reflexo enquanto te mordo os lábios de virgem involuntária sabendo que me afastas contra vontade enquanto te tomo e faço minha para sempre num só beijo, essa boca ansiosa de amor, violar os teus ouvidos com palavras doces e obscenidades subentendidas na hora da paixão submeter-te à energia que pulsa vigorosamente dentro de ti, expulsar os demónios da saudade que te perturbam o cio e fazer-te lembrar de como é bom o sabor de sangue do costume proibido, vejo-te no espaço infinito da memória como uma imagem vital, como algo que pela sua força muda as leis do universo e do destino, sopras em mim o desejo que não compreendo e não consigo lutar, sinto-te parte de mim como se a tua presença transcendesse o espaço infinito do teu jeito e habitasse a energia de todos os corpos e que vivesses em mim antes do nascimento e me tivesse amado numa espiral infinita de existências e realidades em completo desprezo pelas normas alheias e morais hipócritas, sacrifico-me a cada minuto por olhar para ti e ser tocado pelas imagens de carne, desejos de sabor quente e mente vazia, perturba-me os teus lábios frutados, húmidos de convite, a lentidão dengosa em que te moves em silêncio, descaindo coxa com coxa ondulante e fatal, sinto o teu peito suspirar ofegante entre olhares e no entanto incapaz de te fazer minha, de te roubar a este destino vulgar, te arrancar do chão cavalgando montanhas para te levar para longe de tudo isto que nos faz não viver que nos faz calcorrear caminhos sem paz e sem destino quando o que queremos é estar frente a frente esboçando um não declarado sorriso de convite, gostava de te dizer tudo isto, sem me perder em raciocínios alheios ao que sinto, sem gaguejar vulgaridades ímpias e fazer-te a mulher única que és e merecer ser, mostrar-te o que vejo em ti uma força da natureza indomável e indelével, saber-te minha faz o meu tempo parar e retroceder só para poder voltar e reviver aquele momento ténue efémero em que olhaste para mim e me fizeste teu sem intenção, é essa a tua força, a tua vitalidade que o mundo pulsa e volta a pulsar como uma vibração intemporal que nos atrai a todos para o mesmo destino, o teu amplexo prostrando-me perante ti como sentenciado a uma pena fatal e deixando na tua mão a misericórdia de decidir o destino do meu mundo, da minha existência fútil e microscópica enquanto amante imaginário de uma rainha canibal e carnívora desejando ardentemente ser o escolhido para o próximo festim e que apenas o olhar momentâneo justifique a aniquilação definitiva da sua existência sem remorsos ou pensamentos de dúvida, morreria descansado e numa realização profunda se morresse nos teus braços sabendo ter-te amado completamente, continuo de uma forma ou outra a arrastar os minutos perdido e insuspeitado escondido na minha intenção de beber o teu olhar, conto os segundos com a precisão de relógio sem ponteiros apenas dúvidas, apenas para poder estar contigo de novo sabendo que a minha vida se resume à fracção de tempo em que me assaltas e assustas, arrestas o meu coração com o teu sorriso, asfixias-me até ao último suspiro só para depois soltares-me momentos antes da morte pelo prazer gratuito de me poderes fazer voltar a sofrer a mesma agonia da tua indiferença, sinto-me lisonjeado pela tua meticulosidade predatória sabendo que retiras disso o doce deliberado da tortura, esta angústia crescente que cultivas no meu peito e que adoras alimentar, lambendo as feridas de animal saciado pelo desejo e pelo fascínio que sabes que tens mas que não tens ideia objectiva e certeira de que possuis essa maldade, esse suave veneno conseguiu atingir